Ser professor em tempos de pandemia

Pernambuco

15.10.2020

Em Itaquitinga, Zona da Mata Norte do Estado, a professora Antônia de Barros Pereira, de 59 anos, desbravou outros mundos por conta da pandemia. Há quase quatro décadas em sala de aula, ensinando e aprendendo presencialmente com os estudantes, a docente da Escola de Referência em Ensino Médio (EREM) Denival José Rodrigues de Melo foi surpreendida pela pandemia, pelo medo e pelo ensino remoto. As novas aulas, diante da tela do computador, lhe trouxeram outras preocupações: a saúde mental e física dos alunos, além de sentir a disparidade social mais evidente neste período.

A primeira vez de Antônia em sala de aula foi aos 20 anos, quando passou a ensinar crianças de um engenho, na zona rural da cidade. Emocionada, sem esconder as lágrimas, ela conta como descobriu a vocação. “Eu tive uma infância muito humilde. Meus pais criaram 14 filhos com muito esforço. Passamos a ajudá-los no comércio ainda crianças, mas nunca deixaram a gente sem estudar. Quando terminei meus estudos, comecei a ensinar numa região onde não tinha escola. E tive a oportunidade de alfabetizar meu primeiro aluno, que na época tinha dez anos. Vê-lo escrever e ler em voz alta a lista de compras que sua mãe pediu me deixou sem chão de tanta emoção. Minha vida se transformou ali. Eu consegui mudar uma realidade naquele dia. E percebi que poderia fazer muito mais que isso”, detalha, entre uma pausa e outra, com voz embargada. 

Com o pouco dinheiro que ganhava, Antônia pagou a faculdade, se formou e realizou o sonho de ensinar em escolas do Estado e do município. “Eu não me vejo fazendo outra coisa. Na escola eu ensino, eu ajudo, eu escuto, eu sou uma agente transformadora. É ali onde eu também aprendo. Quando os alunos me perguntam algo que eu não sei, eu não tenho vergonha. Eu digo: não sei lhe responder, mas vamos encontrar a resposta juntos? E acredito que é esse o papel do professor na escola. É lá onde eu me realizo, onde eu sou feliz”, diz. 

A rotina de 38 anos lecionar e acompanhar os estudantes diariamente de perto mudou de repente, por conta da pandemia da Covid-19 neste ano. Com o anúncio do isolamento social, Antônia passou a lidar com novas preocupações. “Muitos desses estudantes são carentes, vivem realidades muito duras, e a escola é a única esperança deles. Sempre que eu dava aula pelo computador e sentia falta de algum, eu ligava, perguntava o que estava acontecendo, se eles precisavam de algo, se estavam bem física e emocionalmente. É uma diferença enorme das aulas presenciais. Ali, cara a cara, a gente sabe quando alguém não está concentrado, se está passando por algum problema. E pelo computador, não. Eu sempre estive muito atenta em todos eles. São vidas que eu prezo muito, são futuros que estão em jogo e eu não meço esforços para ajudar esses adolescentes”, acrescenta a docente. 

Além das condições dos estudantes, Antônia enfrentou outros desafios durante o trabalho remoto, como manejar a tecnologia e as redes sociais. “A Secretaria de Educação e Esportes me deu todo o auxílio durante essa pandemia. Participei de formações, contei com ajuda de profissionais que me ajudaram a mexer melhor no computador, a criar salas para dar aulas, entre outros pontos, mas não foi nada fácil. Para mim, que estou há quase quarenta anos em sala de aula, de repente ter que ensinar através de uma tela, foi algo provocante”. A docente acrescenta que os suportes pedagógicos que a Secretaria disponibilizou, como o Educa PE, surgiram, também, como uma oportunidade para se reciclar profissionalmente. 

“Eu ensino História e Sociologia há muitos anos. Sempre procuro atualizar a minha metodologia, então eu fiz o seguinte: assistia todas as aulas do Educa PE com os alunos e prestava bem atenção no modo de ensinar dos outros professores. Acredito que o nosso papel não é só cumprir o plano de aula, mas inovar, se aproximar mais da linguagem do aluno, compreender e atender as necessidades dele enquanto estudante. O verdadeiro professor que quer educar se adapta a todas as adversidades dessa vida, com ou sem pandemia. É amor, vocação e sede de transformar vidas antes de qualquer coisa”, conclui, emocionada, ao lado do filho que estuda para seguir seus passos.