Reforma do ensino médio é tarefa 'grande', diz Consed em entrevista ao Valor

Ensino Médio

10.02.2017

Aprovada no Senado, a Medida Provisória (MP) que reforma o ensino médio brasileiro deverá ser sancionada "muito rapidamente", afirmou ontem o presidente Michel Temer. Mas, para que chegue às escolas, a implementação das mudanças exigirá grande capacidade de organização dos Estados, responsáveis pela oferta de ensino médio no Brasil, na visão do Conselho Nacional de Secretários de Educação (Consed). 

"A reforma está bonita no papel agora, mas o trabalho para ela ser construída é muito grande", afirmou o diretor do Consed, Antonio Neto, que diz que a entidade pretende apoiar as secretarias estaduais a fazerem esse diagnóstico de quais serão as prioridades de cada região. "Muitas pessoas acham que agora que foi feita a lei, rapidamente cada escola vai escolher suas disciplinas e implementar. Vai ser muito difícil".

Pelas mudanças, que podem começar a ser implementadas a partir de 2018, o currículo do ensino médio oferecido nas escolas deve ser 60% preenchido pela Base Nacional Comum Curricular (BNCC). Os 40% restantes serão destinados aos chamados itinerários formativos, em que o estudante poderá escolher entre cinco áreas de estudo. A expectativa é que a Base seja definida até o fim de 2017. O ministro da Educação, Mendonça Filho, disse que não há um prazo máximo para que todas as escolas estejam no novo modelo e que espera que haja uma demanda dos próprios Estados para acelerar o processo.

Neto explica que, nas novas regras, cada Estado precisará pensar a rede estadual de ensino como um todo em decisões que envolverão 5 mil escolas, em alguns casos,e não mais definir as grades pensando cada escola isoladamente. "Uma escola, agora, nesse novo modelo, impacta a escola ao lado. Uma vai ter tal área de ênfase, e outra uma diferente. Vai mexer com a matrícula de todos os alunos", prevê Neto, que acrescenta, no entanto, que a reforma abre uma oportunidade positiva para que os Estados se reorganizem e façam melhor uso da rede. "Pela primeira vez estamos vendo uma lei que fortalece o caráter federativo. Não é um MEC que vai definir o currículo das escolas", diz.

Nas regras atuais, cada escola tem uma grade fixa de disciplinas, com professores aptos a trabalhar em determinados dias e horários da semana. "Mudar isso envolve sala de aula, envolve recursos humanos, que é professor apto para trabalhar naqueles dias e horários, além de demanda fazer um olhar de quais áreas serão mais importantes em determinadas regiões".

O projeto prevê que os alunos poderão escolher a área na qual vão se aprofundar já no início do ensino médio. As escolas não são obrigadas a oferecer aos alunos todas as cinco áreas, mas deverão oferecer ao menos um dos itinerários formativos. "Talvez você não tenha, em um primeiro momento, recursos humanos suficientes para disponibilizar todas as áreas [de ênfase das disciplinas] em todas as escolas da rede", diz.

Ao discursar ontem em evento da Caixa Econômica Federal, o presidente Michel Temer afirmou que a proposta foi suficientemente discutida. "O debate sobre ensino médio foi feito durante seis meses". Temer voltou a destacar ainda que, no Orçamento deste ano, já sob a vigência da regra do teto dos gastos, a educação teve um aumento de R$ 10 bilhões em recursos.

Na opinião do professor Marcos Garcia Neira, da faculdade de Educação da USP, uma mudança desse porte na educação não poderia ser implementada por meio de Medida Provisória. "Foi bastante questionada em outubro, quando foi publicada, teve alterações mínimas e foi aprovada no Senado", diz Neira, que crê que a falta de diálogo tornará a implementação mais difícil. Além disso, Neira alerta para a tendência de que áreas que têm escassez de professoresformados na área em que atuam, como física, tendem a ser menos ofertadas nas redes públicas de ensino de algumasregiões. "Talvez, no seu bairro, nenhuma escola pública ofereça aquele itinerário que você queira cursar", alerta Neira.

Por Ligia Guimarães e Lucas Marchesini

(Com Agência Brasil)

http://www.valor.com.br/brasil/4864704/reforma-do-ensino-medio-e-tarefa-grande-diz-conselho