Professor adia aposentadoria e deixa legado de educação ambiental para a cidade de Iguape (SP)

São Paulo

21.03.2024

Quando o médico recomendou a aposentadoria ao professor de geografia Paulo Sérgio da Silva há dez anos, após diagnóstico de retinose pigmentar, condição que reduz o campo de visão, o docente decidiu que ainda queria continuar a ensinar e estar perto de seus alunos. Antes de realmente se aposentar, o que aconteceu agora em 2024, o professor formou mais de 700 agentes ambientais mirins, já impactou mais de 5.000 alunos da rede pública na cidade e deixou um legado de educação ambiental e sustentabilidade à cidade de Iguape.

Por conta da sua condição ocular, o professor foi afastado da sala de aula e passou a integrar o programa Sala de Leitura, espaço onde fica o acervo de obras literárias nas escolas estaduais. No mesmo ano, em 2014, foi na Escola Estadual Professor Veiga Junior que Silva idealizou o Projeto Agentes Ambientais Mirins (Paam) para incentivar alunos a propor soluções sustentáveis para problemas cotidianos, além de promover a formação continuada dos mesmos sobre a preservação da Mata Atlântica e tradição caiçara. 

Desde então, o projeto já realizou cinco seminários anuais e envolve toda a comunidade escolar de Iguape, incluindo outras escolas estaduais, municipais e privadas. Anualmente, mais de 5.000 estudantes participam dos seminários.

“Tenho ex-alunos que se tornaram policiais militares ambientais, engenheiros ambientais ou mesmo que praticam a sustentabilidade em seu dia a dia”, conta o professor. 

Linha do tempo

Muito querido entre os estudantes, já à frente da Sala de Leitura, Paulo Sérgio propôs aos seus alunos dos anos finais do Ensino Fundamental a realização de reuniões semanais aos sábados de manhã para a discussão de um projeto que tivesse como premissa a sustentabilidade. Pouco mais de 30 alunos compareceram no primeiro encontro. Seis meses depois, a turma já contava com 120 colaboradores do 6º ao 9º ano da escola.

“Na primeira reunião, o projeto já tinha nome e um fluxo estabelecido de como seria realizado. Naquele momento, a ideia era compartilhar conhecimentos, sobretudo tradicionais da região, sobre meio ambiente e preservação da Mata Atlântica, mas houve também o espaço para a execução de um projeto comum dos alunos”, explica o professor.  

O projeto em comum mencionado por Paulo foi o mutirão de plantio de palmito juçara na reserva ambiental Morro do Espia, em Iguape. Ao todo, foram 500 mudas, além de diversas sementes da espécie, nativa da região, plantadas com a ajuda de policiais militares ambientais. 

Entre 2014 e 2016, o Paam se voltou para a execução de iniciativas sustentáveis simples, concentradas em exposições, formações e outras atividades pedagógicas. Em 2015, por exemplo, duas escolas estaduais e uma Escola Técnica Estadual participaram do projeto por meio de intercâmbio entre os estudantes, em um formato em que os alunos de uma escola ensinavam os visitantes de outra unidade sobre um tema sustentável.    

Sementes

“Tudo mudou em 2017, quando decidimos concentrar as iniciativas em um seminário anual”, explica o professor. “Tivemos que abrir um formulário no começo do ano para que os alunos da Escola Estadual Professor Veiga Júnior e das demais escolas interessadas pudessem apresentar os seus projetos realizados ao longo do ano, criando um grande encontro de estudantes para a troca de ideias e conhecimentos em sustentabilidade.” 

A data escolhida foi o Dia Mundial do Meio Ambiente, 5 de junho, enquanto a inspiração para o tema foi a campanha da Organização das Nações Unidas (ONU) “Árvores pela Terra”, que estimava plantar uma árvore para cada pessoa na terra. Na ocasião, 600 mudas de árvores nativas da Mata Atlântica foram plantadas pelos alunos na Fundação Florestal de Iguape. Ao todo, 14 escolas, entre unidades da rede estadual, municipal e privada, participaram do ato em celebração ao primeiro seminário do projeto, totalizando cerca de 5.000 estudantes. Desde então, as escolas seguem parceiras da iniciativa. 

Em 2022, o professor Paulo passou a integrar a Sala de Leitura  da Escola Estadual Clodonil Cardoso, que já participava do projeto anteriormente. “Como esta é uma escola do Programa de Ensino Integral, foi necessário adaptar os encontros que antes ocorriam no sábado de manhã, passando para reuniões diárias do clube juvenil”, explica o professor, que ficou feliz por ter, dessa vez, a colaboração de alunos do Ensino Médio na produção do seminário. 

“Eu lembro de tudo como se tivesse sido ontem. Me recordo de excelentes projetos de outras escolas, a exemplo da pesquisa sobre espécies invasoras na orla da praia, que prejudicam a preservação do nosso bioma”, diz o professor Paulo.

Daqui para o futuro

A aluna Kaandra Gonçalves de Jesus Okazaki, da 2ª série do Ensino Médio da escola Clodonil, conta com orgulho sobre a ligação que ela criou com o Paam e o desejo de dar continuidade aos projetos nos próximos anos. “Nos últimos anos, fui presidente da comissão organizadora, depois apresentei uma horta hidropônica com um sistema hidráulico automatizado”, conta ela, que é de família de produtores rurais e contou com a ajuda da mãe nas duas ocasiões. 

“Sou rigorosa quando o assunto é meio ambiente, e atuar no Paam é como fazer algo pelo planeta. Sem o projeto, talvez não tivéssemos tantos jovens engajados na causa em Iguape”, ressalta a estudante.  

A dirigente regional de ensino de Miracatu, professora Vanessa de Oliveira Dias, exalta a transformação promovida pelo professor. "Posso definir o professor Paulo Sérgio como um verdadeiro 'jardineiro planetário', um dos temas trabalhados por ele em um dos seus seminários. Ele é exatamente essa pessoa: carinhosa, responsável, comprometida, engajada e que cativa a todos, fazendo com que os estudantes pesquisem, compreendam e transformem para melhor o local onde vivem", descreve a dirigente. 
 

"É um privilégio ter a figura do professor Paulo em nossa diretoria de ensino. A sua carreira contribuiu de maneira ímpar com a educação de Iguape e queremos que ele continue por perto. Espero que ele esteja muito feliz com o que semeou e que nossos estudantes e corpo docente sigam o seu legado", conclui a professora.

Nesta quinta-feira, 21 de março, comemora-se o Dia Internacional das Florestas e das Árvores.