Alagoas
02.10.2021O esporte como instrumento de inclusão social já tirou muitos jovens das ruas, resgatou adolescentes da criminalidade e transformou a realidade de muita gente. Histórias como a da ex-ginasta Daiane dos Santos, do ex-boxeador Popó e da jogadora Marta mostram o quanto iniciativas esportivas nas comunidades carentes podem ser poderosas ferramentas de transformação na vida dos jovens. Relatos semelhantes podem ser encontrados na Escola Estadual Dr. Fernandes Lima, no bairro São Jorge, onde o Mestre Valter Abílio, que é faixa preta de Taekwondo em Alagoas, se voluntariou para ensinar a arte marcial para os estudantes da escola.
A unidade de ensino fica localizada em um bairro da capital alagoana com histórico de criminalidade alta, e por isso, o projeto surgiu pela necessidade de oferecer aos estudantes uma alternativa produtiva de recreação, que pudesse também resgatá-los das ruas e auxiliar na sua formação enquanto cidadãos. “Vimos que a gente precisava fazer algo mais por esses meninos, um trabalho mais social além do esporte. Por isso, nessa comunidade o projeto não tem o objetivo de formar atletas e sim cidadãos com valores” relata o Mestre Valter.
As aulas de Taekwondo chegaram na escola em 2018, e o projeto já atendeu turmas de até 30 alunos, dentre estudantes da escola, servidores e até pais e responsáveis. Os treinos acontecem dentro da escola, num horário após as aulas, gratuitamente. Com a pandemia, os atletas ficaram sem o espaço da escola para treinar, o que afetou o número de participantes, mas após o retorno do ensino presencial, o projeto pôde ser retomado dentro da unidade de ensino.
Todos os materiais utilizados para a prática do esporte, como luvas, faixas e kimonos foram obtidos pelos estudantes, através de rifas e mobilizações entre os próprios participantes. Por meio do projeto, os jovens também são estimulados a competir em torneios esportivos, e a escola já conseguiu faturar um troféu da participação dos alunos no campeonato nacional de Taekwondo em 2019. “Sempre tentamos nos mobilizar para levá-los às competições, nos organizamos para custear as inscrições com o apoio dos pais e assim em 2019 estivemos no campeonato da liga nacional em Recife, nossos alunos conseguiram destaque, tivemos um campeão e dois vice-campeões” destaca o Mestre de Taekwondo.
A arte marcial coreana foi reconhecida como esporte olímpico nos anos 2000, e além de ser uma atividade física, ensina sobre autocontrole, respeito e ética, valores que são passados no tatame e podem ser refletidos dentro da sala de aula. O ex-aluno da escola, Ewerton Samuel, hoje faixa azul de Taekwondo, não conhecia a arte marcial e através do projeto se graduou e já participou de duas competições regionais. Como o projeto é aberto à comunidade, o jovem continua participando e futuramente pode se tornar instrutor.
“Eu não conhecia o Taekwondo, só ouvi falar na televisão, e decidi participar do projeto por curiosidade. Na escola, o Taekwondo me ensinou sobre autocontrole, eu consegui controlar meu nervosismo e minha ansiedade na hora de apresentar trabalhos para a turma, fazer atividades no quadro, e durante as provas. Até quando eu saí da escola e hoje em dia no trabalho eu tenho outra postura.”
Para a escola, o projeto do Taekwondo se tornou uma ferramenta fundamental para auxiliar no desenvolvimento estudantil. “É bem nítido que existe uma melhora na concentração dos alunos, na atenção, no respeito e na dedicação que não fica só no esporte é levada também para os estudos” relata o coordenador da escola e professor de educação física, Getúlio Peplau.
A diretora da escola Michelle Lins Teles Monteiro ressaltou o quanto o projeto vem estimulando os discentes a evoluírem nas notas e no comportamento. “Vários meninos que tinham dificuldades nas notas, tomaram um rumo melhor na escola. A participação deles é muito importante nesse projeto, mesmo no período das aulas remotas percebemos que eles estavam muito participativos nas aulas onlines”, afirma.
Para que os alunos participem do projeto, a escola vai em cada sala no início do ano divulgar o Taekwondo para estudantes. Para participar não é preciso cumprir nenhum pré-requisito, todos são bem-vindos.
O ex-atleta, Nilo José, que é pai do aluno Gabriel do 1ª ano do ensino médio, também é graduado na arte marcial e voltou a participar do Taekwondo depois de 25 anos, dessa vez como instrutor, além de auxiliar na administração financeira das doações destinadas ao projeto. “É muito importante o pai incentivar o filho e saber que tipo de arte ele está fazendo, não é só colocar o filho em uma arte marcial sem conhecer o professor”, destaca Nilo José.
Como pai, Nilo também afirma que percebeu melhoria no comportamento do seu filho. “É um trabalho que a gente vem fazendo que não é só ensinar Taekwondo, ensinamos disciplina, colocamos um rumo para eles, uma meta para eles conquistarem”, complementou.