Sergipe
22.09.2023Além de embalar os sonhos de Philipe Cardoso Matos, 11 anos, aluno do 6º ano do ensino fundamental da Escola Estadual Professor Valnir Chagas, em Aracaju, a paixão pela dança também tem acelerado a carreira do bailarino mirim. O jovem será o único menino que representará Sergipe na quinta edição do Prêmio Internacional de Dança de São Paulo (Pridansp 2023), que acontecerá na capital paulista entre os dias 21 e 24 de setembro, no Teatro Sérgio Cardoso.
O aluno da rede pública estadual de ensino conta que começou a praticar o ballet aos quatro anos de idade, mas seu interesse vem desde antes. O sonho de ser um bailarino surgiu como um passe de mágica ao assistir quase que ininterruptamente um filme da Barbie.
“Ela (a boneca) foi fazer um teste e não conseguiu passar. Então, ela calçou uma sapatilha mágica e, quando calçou, viajou pelo mundo. Aí ela dançou várias danças, como Giselle, Quebra Nozes... eu me inspirei nela. Coloquei uma sapatilha imaginária, afastei o sofá da sala e comecei a dançar. Eu assistia ao filme todos os dias. Para onde eu ia, levava aquele DVD e chamava todo mundo para dançar comigo. Na rua, eu dava aula de dança para os meus colegas. Na praia, eu dançava com a minha irmã. Não sei dizer ao certo o que sinto, mas é muito bom dançar. Eu me sinto leve quando danço”, narra o bailarino.
Apesar da pouca idade, Philipe sempre foi determinado na realização de seu sonho. Dos primeiros passos até chegar ao Pridansp foi um longo e desafiador caminho que precisou trilhar. Ele, com o apoio irrestrito de familiares, precisou lidar com o preconceito de colegas nas escolas anteriores em que estudou. Passou por dois estúdios de dança que não souberam aproveitar o seu potencial como menino bailarino. Até que, em 2020, se apresentou no K Dance Studio, sob a orientação da professora de ballet, Klely Perelo, e tudo começou a mudar.
Philipe sentiu que naquele local estava sendo valorizado e desafiado a elevar seu potencial artístico. Além de treinar com maior intensidade, Philipe também começou a participar das provas de grau da Royal Academy of Dance, de Londres, do qual o K Dance Studio faz parte. Atualmente, ele é considerado um bailarino de grau 5. Depois deste grau, explica o menino, o bailarino deve escolher entre seguir até o grau 8, considerado ainda amador, ou partir para uma formação profissional, que leva mais dois anos. Philipe já tem a decisão tomada: “com certeza eu vou investir na formação profissional porque dançar é o que eu amo fazer”.
Em março deste ano, Philipe se apresentou na primeira Mostra do Conselho Brasileiro de Dança, em Sergipe. Nesse evento, vieram profissionais/olheiros de São Paulo e do Rio de Janeiro que ofereceram bolsas e convidaram os dançarinos destaques para se apresentarem em outros eventos competitivos. Philipe foi convidado para participar de três eventos. Por uma questão de custos, Philipe e sua professora Klely decidiram participar de dois. O primeiro, Festival Nacional de Dança Balance aconteceu em junho, em Camaçari/BA. Nas duas modalidades em que Philipe competiu (um clássico de repertório, da coreografia Paysant do ballet Giselle; e um solo em Jazz, com coreografia criada por Klely Perelo) ele ganhou o primeiro lugar. O segundo é justamente o Festival Internacional de Dança de São Paulo (Pridansp), considerada a grande vitrine para jovens dançarinos de todo o país, tendo em vista que a comissão julgadora do prêmio é composta por 12 personalidades da dança nacional e internacional.
“Tenho treinado muito, todos os dias, pelo menos uma hora e meia. Quero estar bem preparado para fazer bonito no palco. Quero que minha mãe, minha tia e minha professora tenham orgulho de mim. Porque dançar é o que eu gosto e quero fazer para o resto da minha vida”, frisa o bailarino.
Rede de apoio
As conquistas de Philipe são motivos de orgulho para um grupo de mulheres que dão sustentação ao desejo do menino de se tornar um bailarino profissional. Com os olhos lacrimejantes, Telma Cardoso dos Santos diz, emocionada, que o filho sempre pode contar com o seu apoio. “Não foi fácil. Passamos por momentos difíceis. Tivemos que superar o preconceito e a intolerância de algumas pessoas, inclusive, crianças que acabam replicando palavras e atitudes dos pais. Mas isso é passado. Tudo o que eu quero é que o meu filho seja feliz, e eu dou toda a liberdade para ele voar”, afirma.
A tia, Dulce Maria Cardoso dos Santos, é outra grande incentivadora de Philipe. Foi ela que realizou a primeira matrícula na escola de ballet, assim como é ela quem acompanha Philipe nas viagens. “Eu via o esforço dele e a necessidade que ele demonstrava em dançar. Então, eu fiz a matrícula dele numa escola próxima de casa. Hoje eu sei que não era o ideal porque a professora não estimulava as potencialidades dele; ao contrário, eu tinha a impressão de que ela o escondia entre as meninas, mas era o que podíamos oferecer no momento. Também fui eu quem procurou a professora Klely para fazer um teste e, felizmente, estamos com ela desde então e com planos muito promissores para o futuro”, enfatiza a tia.
A professora de ballet, Klely Perelo, reforça que Philipe é um diamante que está sendo lapidado. “Desde o primeiro momento, eu fiquei encantada com a desenvoltura de Philipe e disse para mim mesma: ‘ele nasceu para ser bailarino’. Mas é importante frisar que o ballet exige uma técnica. Essa técnica é adquirida a partir de um processo que demanda treino, foco e dedicação. Desde o início, Philipe demonstrou esse comprometimento, e a gente percebe essa evolução. Além disso, o fato de ele ser um menino, num ambiente com predominância de meninas, também acende um foco de atenção dos especialistas que estão em busca de bailarinos masculinos”, destaca a professora.
A diretora da Escola Estadual Professor Valnir Chagas, Andreia Abreu, é outra mulher importante nessa rede de apoio que tem sido construída para alicerçar o sonho de Philipe. Segundo a educadora, o aluno chegou à rede pública este ano e foi muito bem acolhido por toda a comunidade escolar. “Ele é um menino maravilhoso e muito educado. Quando começamos o ano letivo, ele tinha receio de como seria recebido pelos colegas, a respeito do ballet. Diante desse histórico, a gente teve todo o cuidado de fazer com que ele se sentisse acolhido por seus colegas e professores. Quando ele se sentiu à vontade para dizer à turma que ele era bailarino, nós estávamos do seu lado para apoiá-lo. Tivemos um diálogo muito aberto com a turma. Philipe falou da sua paixão pela dança e os colegas fizeram perguntas. No final, todos se entenderam”, salienta a diretora.
Este novo momento de Philipe é de pura luz. Ele se sente feliz e acolhido pelos colegas e professores da escola. Sua professora de ballet enxerga todo o seu potencial e trabalha forte para deixá-lo pronto para os novos desafios que surgirão, enquanto a família é a demonstração de amor e de respeito, ou seja, tudo de que uma criança precisa para construir uma vida de sucesso.